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R7 Brasília

Quatro feminicídios por dia: por que as mulheres brasileiras ainda morrem tanto dentro de casa?

Brasil registrou 1.459 feminicídios em 2024; especialistas explicam por que o crime persiste

Brasília|Luiza Marinho*, do R7, em Brasília

A cada 17 horas, ao menos uma mulher foi vítima de feminicídio em 2024 Elza Fiúza/Agência Brasil

No Brasil, quatro mulheres são assassinadas todos os dias por razões de gênero. Isso quer dizer que elas são mortas por serem mulheres. Em 2024, o país registrou 1.459 feminicídios, segundo o novo Mapa da Segurança Pública, divulgado na quarta-feira (11) pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública. Os números não recuam, e a pergunta continua a ecoar com urgência: por que as brasileiras ainda morrem tanto dentro de casa?

Vanessa da Conceição tinha 32 anos, um bebê recém-nascido e uma vida pela frente. Como tantas outras brasileiras, ela acreditava que sua casa era um lugar de abrigo — mas foi ali que encontrou a morte.

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Ela foi assassinada dentro de casa, em Samambaia (DF), após uma discussão com o companheiro, com quem vivia havia cerca de três anos. O motivo seria o suposto furto de um celular. Embriagado, o homem desferiu um golpe de faca no pescoço da vítima. Vanessa morreu no local.

De acordo com Cynthia Mara, professora pesquisadora na área de gênero, nesse tipo de crime, como o caso de Vanessa, é comum que homens associem o fim de um relacionamento ou a perda de controle sobre a parceira à violência extrema.


“É um crime decorrente de várias causas. E é sempre uma escalada, uma violência doméstica, inconformismo com a separação, ciúmes, machismo, vingança e, principalmente, sentimento de perda de controle sobre a mulher”, diz.

Segundo ela, os índices alarmantes do feminicídio no Brasil estão atrelados às estruturas de desigualdade de poder e de gênero do país.


“A desigualdade entre o gênero pode ser vista em vários âmbitos da sociedade, e quando uma mulher atinge um espaço de destaque, ela a a ser ainda mais vítima do machismo. Essa estrutura acaba por destacar a ausência ou limitação de políticas públicas de combate e aumento do feminicídio.”

Aumento de casos

O levantamento referente a 2024 apontou uma leve alta de 0,69% nos casos em relação a 2023, quando foram 1.449 feminicídios. Apesar do aumento absoluto, a taxa nacional permaneceu estável: 1,34 mortes por 100 mil mulheres.


O número acompanha o crescimento da população feminina, que ou de 107 milhões para 109 milhões desde 2020. O Centro-Oeste lidera com a maior taxa proporcional (1,87 feminicídios por 100 mil), enquanto o Sudeste concentra o maior volume absoluto de casos (532 casos).

No recorte municipal, as capitais do Rio de Janeiro e de São Paulo lideram com 51 casos cada. Brasília também aparece entre as dez cidades com mais ocorrências (23).

Ana Lisboa, psicanalista especialista em saúde mental feminina, já atendeu mulheres vítimas de violência em defensorias públicas e delegacias e explica que fatores emocionais ou psicológicos podem dificultar que uma mulher em situação de violência rompa o ciclo antes que ele chegue ao extremo.

“Muitas delas permanecem em relações abusivas não apenas por fatores externos, como dependência financeira ou falta de apoio, mas por razões internas e inconscientes. Repetem padrões aprendidos na infância por terem uma autoimagem fragilizada, construída em ambientes familiares adoecidos, com histórico de abandono, agressões ou abusos.”

A ligação com o agressor costuma ser inconsciente, marcada por baixa autoestima, medo de rejeição e culpa enraizada desde a infância.

“O agressor, por sua vez, alterna manipulação e violência, mantendo a vítima emocionalmente confusa. Romper esse ciclo exige mais do que apoio externo — é preciso reconstruir a autoestima e a autoconfiança da mulher”, frisa Ana Lisboa.

Justiça

A nova lei do feminicídio, sancionada em outubro do ano ado, alterou o tratamento do crime no Brasil, tornando-o um crime autônomo, com pena de reclusão de 20 a 40 anos. A legislação também estabeleceu novas regras para a aplicação da pena e aumentou a punição para crimes cometidos contra a mulher por razões da condição do sexo feminino.

Apesar dos avanços legais, a promotora do MPDFT (Ministério Público do DF e Territórios) Thais Tarquínio avalia que ainda há entraves para responsabilizar os agressores antes que o crime extremo aconteça.

“A lesão corporal simples no Brasil ainda tem pena muito baixa. Na maioria dos casos, os réus não são responsabilizados de forma efetiva pelos atos que antecedem o feminicídio”, alerta.

Para ela, esse controle se expressa principalmente dentro do espaço doméstico. “Vários crimes de feminicídio ocorrem na casa das vítimas, um ambiente vulnerável e típico do exercício de controle do agressor sobre a vítima”, explica.

No âmbito penal, Jéssica Marques, advogada especialista em violência doméstica, analisa que a mudança da lei pretende acompanhar a crescente do crime, mas também vê desafios.

“Ela precisa estar aliada à Lei Maria da Penha, que é o instrumento mais completo de proteção à mulher em situação de violência. O problema é que a alta demanda impede um atendimento individualizado e acolhedor. Muitas vezes, as medidas protetivas não são eficazes porque não há tempo para uma análise profunda do caso.”

A lei assegura uma resposta imediata ao pedido de proteção, mas, na prática, Jéssica enxerga que a falta de informação e estrutura faz com que medidas genéricas não impeçam a continuidade da violência, especialmente em casos de dependência econômica.

“Somente com trabalho preventivo, análise cuidadosa dos casos e aplicação eficaz das medidas protetivas é que será possível reduzir os feminicídios no país”, conclui.

*Sob supervisão de Leonardo Meireles

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